domingo, 16 de outubro de 2016

A confecção artesanal da aguardente

O ciclo da aguardente, tal como ela é concebida de acordo com a tradição das nossas aldeias, inicia-se com o pisar das uvas no lagar. O que sobra, depois de espremidos os frutos e retirado o mosto, conhecido por "cango", é então armazenado em local estanque, bem protegido do ar. Em minha casa, chegou a enterrar-se num campo contíguo ao edifício.
Quando o frio se faz anunciar e as habituais tarefas da vida do campo dão algumas tréguas ao agricultor, começa a preparação para o fabrico da aguardente. Foi esse processo que consegui fotografar recentemente, numa aldeia do concelho de Mogadouro.

 A jornada inicia-se com o enchimento do "pote". O meu falecido pai colocava umas vides verdes antes da palha (alguns dos presentes disseram-me que seguiam prática idêntica). A palha serve para evitar que o cango se cole ao fundo do recipiente.
 Deita-se alguma água para ajudar na fervura do material.


 Dá-se uma calcadela, mas sem exagerar, pois se o cango estiver demasiado calcado não vai ferver tão bem.
 Abre-se um pequeno buraco no meio, para facilitar a subida do vapor.

Coloca-se o pote em cima do lume e aguarda-se que comece a ferver.
 Depois da fervura, coloca-se a "cabeça" em cima do pote. As peças são coladas com massa feita de farinha e água. A cabeça do pote é atestada com água fria. A partir daqui convém vigiar o lume para que se mantenha o mais constante possível (nalguns casos, a garotada aproveitava para fazer umas torradas que haveriam de ser bem regadas com azeite. Ainda me lembro bem disso, na minha infância, quando ia a Bruçó e assistia a estes trabalhos). Convém igualmente ir substituindo a água, pois ela vai aquecendo e é importante que esteja o mais fria possível, para ajudar no processo de passagem do estado gasoso ao estado líquido.
 A aguardente começa a escorrer para o recipiente. Em minha casa usava-se uma cana. Aqui, colocaram uma espiga na ponta da mangueira.
Finalmente, há que começar a preparar nova "potada". Torna-se necessário retirar o cango e...
 ... enxaguar bem o pote.
Após a execução desta árdua tarefa, prova-se o precioso néctar. E se a prova for exagerada, corre-se o risco de "apanhar uma cadela"!